10 de September de 2025
Dia do Gordo expõe desafios no transporte aéreo; advogada destaca que falta de acessibilidade reforça exclusão
Foto: Freepik
A advogada destaca que o Dia do Gordo deve ser entendido como um chamado político e jurídico à responsabilidade social.
Dia do Gordo expõe desafios no transporte aéreo; advogada destaca que falta de acessibilidade reforça exclusão
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No Dia do Gordo, celebrado nesta quarta, dia 10 de setembro, é importante debater os direitos das pessoas gordas, sobretudo em contextos que enfrentam desafios específicos, como o transporte aéreo. Apesar dos avanços, passageiros obesos ainda lidam com diversas barreiras, desde a falta de acomodações adequadas e desconforto nas poltronas até práticas discriminatórias.

A advogada e professora Dra. Ísis Keiko Kataoka destacou ao Acorda Cidade que a legislação brasileira, representada pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990), garante que os serviços públicos e essenciais sejam prestados de maneira eficiente, segura e adequada. Contudo, na prática, a proteção não alcança plenamente as demandas específicas da população gorda, que segue arcando com custos e desconfortos.

“Neste dia 10 de setembro, quando se celebra o chamado Dia do Gordo, é necessário ir além da simbologia da data e refletir sobre os direitos das pessoas gordas em um país que ainda insiste em naturalizar práticas discriminatórias. Poltronas estreitas, ausência de acomodações adequadas e a exigência de compra de um segundo assento são apenas alguns dos constrangimentos impostos, que se chocam com princípios constitucionais como a dignidade da pessoa humana, a igualdade e o direito ao transporte adequado”, destacou a especialista.

De acordo com a Dra. Ísis, o debate legislativo precisa avançar. Ela afirma que a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), responsável por regulamentar o setor, ainda não estabeleceu normas claras para garantir assentos acessíveis e inclusivos para corpos diversos.

“Isso revela uma lacuna normativa que acaba por legitimar a exclusão, colocando sobre o consumidor gordo a responsabilidade de pagar mais caro para ter o mínimo de conforto e segurança em uma viagem. Tal cenário não apenas contraria o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), que já consolidou a acessibilidade como direito, como também se mostra incompatível com a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, incorporada ao nosso ordenamento com força constitucional (Decreto nº 6.949/2009). Essa convenção estabelece o dever de adaptação razoável de serviços e espaços. Em outras palavras, não se trata de pedir privilégios, mas de assegurar o cumprimento da igualdade material que nossa Constituição já prevê”, afirmou.

Discriminação além do transporte aéreo

A advogada destaca que o transporte aéreo é apenas uma face de uma realidade mais ampla de exclusão vivida por pessoas gordas. Além dos desafios nos aviões, há discriminação em processos seletivos de emprego, na negativa velada de acesso a espaços de lazer, no atendimento inadequado em hospitais que não possuem equipamentos adaptados a diferentes corpos e até mesmo nas instituições de ensino, que muitas vezes toleram o bullying estrutural.

“Nesses casos, a legislação brasileira já oferece instrumentos importantes. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT – Decreto-Lei nº 5.452/1943) proíbe práticas discriminatórias em contratações e demissões; o Estatuto da Igualdade Racial (Lei nº 12.288/2010) e a Lei Antidiscriminação (Lei nº 7.716/1989) trazem parâmetros contra a exclusão baseada em preconceitos. Mais recentemente, o Supremo Tribunal Federal tem reconhecido que a discriminação estrutural deve ser combatida com firmeza. O que falta, portanto, é a aplicação concreta desses princípios à realidade da gordofobia, de forma explícita e não apenas implícita”, pontuou.

Por fim, a advogada chama a sociedade para uma reflexão urgente e destaca que o Dia do Gordo deve ser entendido como um chamado político e jurídico à responsabilidade social. Ela enfatiza que discutir os direitos das pessoas gordas não é apenas reconhecer a existência da discriminação, mas exigir que o Estado e a sociedade enfrentem suas responsabilidades.

“Se o direito é instrumento de transformação da realidade, é preciso que ele avance no sentido de reconhecer a obesidade não apenas como uma condição de saúde, mas também como um marcador social que expõe indivíduos a barreiras e constrangimentos diários. Isso significa propor marcos regulatórios que obriguem companhias aéreas a oferecer assentos adaptados sem custos adicionais, incentivar a adaptação de espaços públicos e privados a diferentes corpos e promover campanhas educativas contra a gordofobia institucional. É nesse caminho que se concretiza a promessa constitucional de igualdade e dignidade, lembrando que acessibilidade não é favor, mas dever jurídico”.

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